São Luís confirma expectativas de desenvolvimento até 2025, segundo estudos iniciais da McKinsey Global

Em fevereiro de 2020, o blog “O Historiador” repercutiu um estudo da McKinsey Global, que indicava São Luís como uma das 19 cidades brasileiras, entre 600 no mundo, com maior potencial de desenvolvimento até 2025. Agora, após os desafios causados pela pandemia de Covid-19, o progresso da capital maranhense está sendo revisitado, evidenciando que as previsões de crescimento na área científica e tecnológica se concretizaram.

O estudo de 2011 já vislumbrava avanços em ciência e robótica, com destaque para a Universidade Virtual do Maranhão, hoje conhecida como IEMA, e as primeiras cirurgias para o tratamento da Doença de Parkinson realizadas no Hospital Carlos Macieira em 2010. Atualmente, o uso de canabidiol para o tratamento de doenças neurológicas, uma inovação amplamente apoiada por instituições como a UEMA, a Defensoria Pública do Estado, e o Instituto Tricomas, ganhou grande visibilidade. Em dezembro de 2023, a lei estadual 12.183/2023 regulamentou o uso de medicamentos à base de cannabis, solidificando o papel de São Luís na medicina avançada. Desde 2017, a Casa de Apoio Ninar, uma instituição pública do Estado, tem utilizado canabidiol com sucesso no tratamento de condições como microcefalia, autismo e epilepsia.

Além dos avanços médicos, um estudo recente do Instituto Brasileiro de Economia (IBE) colocou São Luís em 17º lugar entre as cidades brasileiras mais desenvolvidas, confirmando as previsões de crescimento econômico feitas há mais de uma década.

Com esses resultados, fica claro que São Luís se mantém firme no caminho do desenvolvimento, particularmente nas áreas de saúde e tecnologia, consolidando sua posição como uma das cidades mais promissoras do Brasil.

FERREIRA GULLAR: Presença de Clarice

Ia ser bom voltar a pensar nela, reler seus livros, pois é só neles que é possível reencontrá-la

 

MEU PRIMEIRO encontro com Clarice Lispector foi numa tarde de domingo na casa da escultora Zélia Salgado, em Ipanema, creio que em 1956. Eu havia lido, quando ainda vivia em São Luís, o seu romance “O Lustre”, que me deixara impressionado pela atmosfera estranha e envolvente, mas a impressão que me causou sua figura de mulher foi outra: achei-a linda e perturbadora. Nos dias que se seguiram, não conseguia esquecer seus olhos oblíquos, seu rosto de loba com pômulos salientes.

Voltei a encontrá-la, pouco tempo depois, no “Jornal do Brasil”, durante uma visita que fez à redação do “Suplemento Dominical”. Conversamos e rimos, mas não voltamos a nos ver num espaço de uns dez anos. De fato, só voltei a encontrá-la logo após voltar do exílio, em 1977. Ela ligou para minha casa: queria entrevistar-me para a revista “Fatos e Fotos”, para a qual colaborava naquela época.

Clarice já era então uma mulher de quase 60 anos, marcada por acidente que resultara em sérias queimaduras que lhe deixaram marcas na mão direita. Já quase nada tinha da jovialidade de antes, embora continuasse perturbadora em sua natural dramaticidade. Depois de ouvir dela algumas palavras carinhosas, decidi revelar-lhe como me fascinara em nosso primeiro encontro.

-Você era linda, tão linda que saí dali apaixonado.

-Quer dizer que eu “era” linda?

-E ainda é, apressei-me em afirmar..

Terminada a entrevista, despedimo-nos carinhosamente, mas no dia seguinte ela ligou de novo. Queria encontrar-me para conversar. Fui até sua casa, no Leme, e de lá fomos caminhamos até a Fiorentina, que ficava perto.

Lembro-me que Glauber Rocha, vendo-nos ali, veio sentar-se em nossa mesa e começou a elogiar o governo militar. Clarice me olhava para com espanto, sem entender. Ele, depois daquele discurso fora de propósito, mudou de mesa.

-Ele veio provocar você, disse Clarice. Com que intenção falou essas coisas?

-Glauber agora cismou de defender os milicos. É piração.

Depois dessa noite, voltei a vê-la num encontro que ela promoveu em sua casa com alguns amigos, entre os quais Fauzi Arap, José Rubem…

Foi a última vez que a vi. A roda-viva daqueles tempo me arrastou para longe dela, em meio a problemas de toda ordem, crises na família, filhos drogados, clínicas psiquiátricas. De repente, soube que ela havia sido internada num hospital em estado grave. Localizei o hospital, telefonei para o seu quarto e acertei com a pessoa que me atendeu ir visitá-la no dia seguinte. Mas, ao chegar à redação do jornal, antes de sair para a visita, a telefonista me passou um recado: “Clarice pede ao senhor que não vá vê-la no hospital. Deixe para visitá-la quando ela voltar para casa”. E se ela não voltasse mais para casa? Dobrei o papel com o recado e guardei-o no bolso, desapontado.

Àquela noite, quando contei o ocorrido a minha mulher, ela explicou: “Clarice, vaidosa como era, não queria que você a visse no estado em que estava”. Pode ser, mas, de qualquer forma, até hoje lamento não ter podido vê-la uma última vez.

Dois ou três dias depois do recado, ela morria. Ao sair do banho, pela manhã, alguém me informou: “Clarice Lispector morreu”. De viagem marcada para São Paulo, entrei num táxi que me levou pela lagoa Rodrigo de Freitas. Não poderia ir a seu sepultamento. O táxi corria dentro de uma manhã luminosa, enquanto a brisa balançava alegremente os ramos das árvores. Clarice morrera e a natureza o ignorava. No avião, escrevi um poema falando nisso. Que mais poderia fazer?

Alguns meses atrás, quando aceitei fazer a curadoria da exposição sobre ela, no Museu da Língua Portuguesa, todas essas lembranças me acudiram. Ia ser bom voltar a pensar nela, reler seus livros, pois é neles e só neles que é possível reencontrá-la agora e nunca naquele saárico túmulo do Cemitério Israelita do Caju, aonde certo dia, sob sol escaldante, fui, com Cláudia Ahimsa, visitá-la. Não havia Clarice nenhuma sob aquela laje de pedra, sem flores. E não havia porque, de fato, o que Clarice efetivamente foi, o que fazia dela uma pessoa única e exasperada, era sua patética entrega ao insondável da existência -e a necessidade de escrever, de tentar incansavelmente dizer o indizível, mas certa de que, ao torná-lo dizível, o dissiparia.

Não obstante, isso era tudo o que valia a pena fazer na vida, conforme afirmou: “Quando não escrevo, estou morta”.

Em compensação, quando a lemos, ressuscita.

Há 16 anos, morreu Escrete, o poeta que cantou a sereia do Maranhão

Há exatos 16 anos, o cantor e compositor José Henrique Pinheiro Silva, o Escrete, faleceu em São Luís, aos 54 anos, na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Geral. Ele não resistiu a complicações decorrentes de um acidente vascular cerebral, agravado por insuficiência renal, diabetes, cirrose e úlcera elevada.

A morte do artista causou enorme consternação em São Luís, e mobilizou dezenas de pessoas que foram homenageá-lo no Memorial Maria Aragão, onde o corpo foi velado. O falecimento de Escrete, que aconteceu na manhã do dia 25 de janeiro de 2007, representou uma grande perda para a cultura popular do Maranhão.

Ao som de um surdo da Favela do Samba e dos atabaques e agogôs do Bloco Afro Akomabu, o cantor e compositor foi sepultado, no final da manhã de 26 de janeiro de 2007, no Cemitério do Gavião. Uma verdadeira multidão acompanhou a pé o cortejo fúnebre, que saiu da Praça Maria Aragão, com o caixão bem à frente colocado sobre um carro do Corpo de Bombeiros.

Familiares, amigos, artistas, intelectuais, sambistas, mães-de-santo, brincantes e dirigentes de grupos da cultura popular e militantes de entidades do Movimento Negro foram dar o último adeus ao famoso compositor maranhense, numa cerimônia carregada de emoção.

Ao longo do percurso da Avenida Beira-Mar até o Cemitério do Gavião, vários intérpretes, entre eles Tadeu de Obatalá, Paulinho Akomabu, Professor Carlão, Luís Carlos Guerreiro e Gisele Padilha, revezaram-se sobre um carro de som, cantando as canções de Escrete, sambas da Favela e músicas do Akomabu.

Sob aplausos, o corpo de Escrete foi sepultado no momento em que muitas pessoas rezavam e integrantes do Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN-MA), da Favela do Samba, do Boi Pirilampo e do Bloco Akomabu, cantando e dançando, também gritavam “Viva Escrete, Viva!”, com uma expressão de dor e sofrimento estampada em seus rostos.

Escrete iniciou sua vida musical no Bairro da Liberdade, onde compôs sua primeira música, no ano de 1979, motivado na luta dos palafitados. A música “Palafita” foi cantada pelo grupo “Rabo de Vaca”. Depois disso compôs para as escolas de samba Unidos da Camboa o enredo “Encantos do mar” e para a Favela do Samba “Sonho infantil”.

Autor de dezenas de sambas-enredos e durante muitos anos compositor da Favela do Samba, Escrete ganhou fama ao fazer um dos primeiros registros da música afromaranhense, com o LP “Malungos”, cujas músicas foram levadas às ruas de São Luís pelo Bloco Afro Akomabu. Depois disso, Escrete gravou a música “Gaiola não é prisão para negro”, em parceria com Joãozinho Ribeiro, e compôs “Sereia”, juntamente com Carlos Gomes e Nicéias Dumont, que se transformou num hino do carnaval maranhense.

Além de ser um dos grandes vencedores de sambas de enredo, Escrete ganhou destaque com o Show Bumba Maranhão, fez parte do Show Canto Afro, gravou seu CD solo intitulado “Lua de Luanda”, participou dos CDs “Pérolas Negras” e “Canto Afro”, em parceria com Paulinho Akomabu e Tadeu de Obatalá, e chegou a lançar uma coletânea com músicas de bumba-meu-boi.

Dando sinais de que já estava com sua saúde muito debilitada, Escrete acabou ganhando uma grande homenagem, no primeiro sábado do ano de 2007 (era o dia 6 de janeiro), com o show “Viva Escrete”, que reuniu um grande número de artistas na sede do Centro de Cultura Negra do Maranhão, na Rua do Barés, no João Paulo.

A festa cultural contou com a presença dos cantores Tadeu de Obatalá, Cláudio Pinheiro, Josias Sobrinho, Teresa Canto, Sami do Cavaco, Walbinho Vamu di Samba, Ribão D’Oludô, Daffé e Joãozinho Ribeiro (atual secretário de Estado da Cultura) e a banda de reggae Guetos. Os cantores maranhenses Cláudio Pinheiro, Zé Carlos Daffé e Rosa Reis, além de Neguinho da Beija-Flor e Ovelha são apenas alguns dos nomes que gravaram músicas de Escrete.

Nascido em São Luís, no dia 15 de março de 1952, Escrete, com tino e talento extraordinários, teve várias participações especiais em shows de cantores maranhenses e teve suas músicas gravadas por vários deles. Escrete foi parceiro de Joãozinho Ribeiro, Paulinho Akomabu, Tadeu de Obatalá, Josias Sobrinho, José Raimundo Gonçalves e Niceas Drumont e outros compositores.

Suas músicas foram gravadas por outros músicos maranhenses e por músicos de outros estados: Cláudio Pinheiro, Rosa Reis, Neguinho da Beija-Flor, Ovelha, Lourival Tavares. Participou do Festival Internacional de Música de São Luís, no show Asa do Vento, onde apresentou músicas do CD Lua de Luanda, e realizava anualmente os shows Canto Afro e Bumba Maranhão.

Dona Noca

Por: Rachel de Queiroz
Em: 17 de junho de 1950

Quem me apresentou a dona Noca foi dona Inês Corrêa de Araújo, pernambucana de velha estirpe, mulher de cultura que — coisa rara — tem sabido dar oportunidade a essa cultura; <em>career-woman</em> de vontade férrea e tremenda capacidade de trabalho, muito bem disfarçadas, entretanto, sob o seu agradabilíssimo exterior de grande dama. Pois foi dona Inês que me apresentou à maranhense dona Noca, — aliás dona Joana Rocha dos Santos — que é prefeita municipal da cidade de São João dos Patos, no seu Estado, desde o ano de 1934.

O encontro se deu numa confeitaria; e senti que o pouco tempo, naquela tarde apressada, não nos permitisse uma conversa mais longa e mais íntima. Porque a verdade é que dona Noca me fascinou, como antes já havia fascinado a minha amiga pernambucana.

É mulher que já deixou de ser jovem, que se veste e se porta como uma matrona discreta. E sabendo-a solteira, a gente logo se lembra dessas priorezas de convento — a autoridade escondida em brandura, sem precisar jamais de levantar o timbre da voz branda, chegando a provocar em quem não a conhece direito a impressão de que até é tímida. Tem a fala suave, a expressão preciosa, como frequentemente acontece com a gente do Maranhão, que fala como se escrevesse — e escrevesse bem. Não sofre daquele desalinho de linguagem a que estamos acostumados no Nordeste, o que admira, pois São João dos Patos já é quase Nordeste, é cidade fronteiriça, a apenas 30 quilômetros do rio Parnaíba.

Aos poucos é que se vai descobrindo nela a mulher excepcional, o temperamento singular que a distingue no seu meio, — e aliás em qualquer meio. Vez por outra, dentro daquela brandura, aponta uma palavra ou uma história que trai a consciência que tem dona Noca da sua força e o quanto ela sabe usar dessa força.

E enquanto ela fala, e responde às nossas perguntas, a gente fica pensando em quem é — se é uma rainha ou uma princesa — cuja lembrança dona Noca nos sugere. De repente sei quem é: é a maharani de um principado hindu que vi representada no cinema pela falecida e admirável Maria Ouspenskaia. A altivez encoberta pela doçura firme. A consciência da sua hierarquia. A coragem pessoal. Até as preciosas joias antigas que dona Noca traz nos dedos e no colo, e o pente de ouro, — sim, de ouro puro — que lhe segura na cabeça o coque discreto, fazem parte da sua pessoa, tal como o grande brilhante da testa fazia parte da pessoa da maharani.

Contou-nos parte da sua vida; desde menina vem aprendendo a mandar, a tomar decisões e a fazer escolhas. O pai negociante forte no Maranhão, era daqueles provincianos de ideias largas que não se intimidam com o meio estreito onde vivem; este acreditava em liberdade feminina, em igualdade entre os sexos e criou a filha de acordo com o que pensava. Menina de dezesseis anos, trazia-a aqui, para o Rio, apresentava-a aos seus fornecedores atacadistas e entregava à filha as encomendas e as transações com bancos e armazéns. Ensinou-a a tratar com gente importante, a defender direitos dos pobres, a se interessar pela coisa pública. Morreu o velho, já agora chefe político no sertão, e dona Noca, naturalmente, ficou no lugar dele. Um belo dia, lá por 1934, foi reclamar junto ao governo contra certa situação política impossível criada pelo potentado local, em São João dos Patos. O interventor ouviu-a, sindicou, descobriu que a moça tinha razão e fez uma coisa estranha que surpreendeu a todos, e mormente a dona Noca: nomeou-a prefeita de São João dos Patos, para que ela própria pusesse cobro aos abusos. Pois dona Noca consertou o errado. E fez o que não se fazia, abriu estradas, limpou a cidade, fomentou a instrução, melhorou as ruas, ergueu prédios. Tão forte é o seu prestígio naquela terra, que de 1934 para cá podem mudar as situações políticas do país e do Estado, mas dona Noca não muda. Continua na chefia do município inalteravelmente.

Contou-me ela que quando acha que vai debilitando a sua energia, deixando que a natureza fraca de mulher a domine mais do que o permitido, faz qualquer coisa que os outros acham maluca — manda selar o cavalo, parte sozinha, apenas com um pajem, em viagens de muitas léguas, noite a dentro, cortando o sertão bravo. Talvez um inimigo — (quem não os tem, e por que não os teria essa mulher forte?) talvez um inimigo lhe prepare um tiro à tocaia. Talvez uma onça lhe mate o cavalo e a ataque a ela própria. Talvez se perca, na escuridão. Pois é disso que ela sente que precisa, para endurecer outra vez. Regressa da cavalgata retemperada, com energia nova. E paga com redobrado carinho a São João dos Patos o que a sua cidade lhe dá em prestígio e gratidão.

Eu tinha um cachorro preto

Eu tinha um cachorro preto (Had a Black Dog) foi o primeiro livro de Matthew Johnstone, publicado na Austrália em 2005. A ideia do livro foi esboçada logo após o trágico evento do 11 de setembro, enquanto vivia em Nova York.

Escrito e ilustrado por Matthew Johnstone

Ao despertar no dia 12 de setembro, percebeu que a vida era curta demais e que não estava vivendo da melhor forma devido a um companheiro indesejável e significativo bem ao seu lado. A depressão tinha entrado e saído da sua vida no o final dos anos 20, quando passou a inventar enormes quantidades de energia para encobri-la.

Mesmo com as pessoas advertindo para que não escrevesse o livro pelo risco de perder seu trabalho e até mesmo amigos, Matthew Johnstone o fez. O autor considera que esta foi uma das melhores coisas que já fez pela sua vida e pela dos outros. Não apenas se libertou, mas permitiu viver uma vida de forma autentica. Considera que a ajudar aos outros ainda é a melhor maneira de se ajudar.

Este vídeo foi criado e publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para ajudar pessoas que sofrem ou conhecem alguém próximo que sofre do “mal do século 21”, a chamada depressão. Atualmente, a depressão afeta mais de 350 milhões de pessoas em todo o mundo. Projeções da OMS estimam que no ano de 2030, entre todas as doenças, a depressão será a mais comum.

O coronavírus e os grupos de risco

Por: Omar Cortez Prado

Muito se têm falado no novo normal que surgirá na pós pandemia do covid19. Pelo que se tem percebido com a abertura de parte das atividades econômicas, entretanto, não haverá um novo normal tão propalado pelos entendidos, aliás, o que se vê hoje são entendidos para todos os lados, entendidos que nada entendem, mas quando surge a oportunidade de se postar diante das câmaras e com toda a pompa, passam a debulhar pseudos conhecimentos em economia, saúde, educação, costumes, etc.

Uma categoria de pessoas que foi estigmatizada como cobaia do covid19, esta sim terá um novo anormal que não se sabe a quantas vai ser possível sobreviver. Trata se das pessoas da terceira idade, com mais de sessenta anos, que foram logo apartados como grupo de risco, não se sabe ao certo se risco para si ou para os outros. Se tornaram rapidinho em hospedeiros e transmissores preferencial do vírus.

A terceira idade que vislumbrou nos últimos tempos um forte incremento na empregabilidade, como irá sobreviver perante uma sociedade extremamente cética?  Diante da presença de um idoso em qualquer ambiente com a presença, digamos, a partir de 10 pessoas, qualquer pigarro, espirro, tosse, que outrora nada significava para os interlocutores, provavelmente será interpretado agora como presença da peste.

Será que a volta ao trabalho será normal ou crucial para o grupo da terceira idade? Há pouco tempo uma categoria preferencial na hora da contratação, não se vê qualquer manifestação do poder público no sentido de estender sua rede de proteção aos que agora não vislumbram quaisquer boas perspectivas no futuro.

O pilão da madrugada

Dona Noca ainda está a espera do seu biografo. Foi a mulher mais dominadora e decidida que conheci. E como mandava… Quando tinha 15 anos, levou-me do Barão a Patos – viagem de dois dias em lombo de burro, que hoje se faz em duas horas de carro – para que passasse lá a festa do padroeiro. Ela admirava minha mãe e transferira ao filho a amizade que as unia.

Fui num comboio de burros que ela própria comandava. No meio da mata, tarde da noite, soou o alarme de ataque. Noca transfigurou-se. Era a líder desassombrada. Em segundos, estendeu o “perímetro de defesa” e cuidou do estado de cada arma e de todos os atiradores. A mim, meteu num buraco, ultraprotegido. No silêncio da noite ninguém se mexia. Não se ouvia outro ruído que não fosse o dos bichos. Felizmente, o rebate era falso, e chegamos em paz a Patos.

Aliás, nessa viagem no comboio de burros, deparei-me pela primeira vez com a generosidade pura, a solidariedade espontânea e desinteressada. No meio da chapada desabitada, ouvi longinquo batido de um pilão, varando a madrugada. Um tropeiro explicou-me o mistério. Três irmãs velhas, a intervalos curtos, faziam, noite após noite, como se pilassem arroz, para que algum viajante extraviado, ouvindo aqueles toques soubessem que ali havia uma casa, onde poderia orientar-se.

*Extraido do livro de Memórias de Neiva Moreira, em depoimento a José Louzeiro, lançado em 1990