Regulamentação da cannabis debatida no Maranhão

A Lei 12.183/2023, que regulamenta o uso da cannabis para fins medicinais no Maranhão, tem enfrentado barreiras quanto a sua aplicabilidade no estado. Uma destas questões é o preconceito e a classe política.

A legislação estadual representa um avanço significativo na luta pela democratização do acesso a tratamentos com cannabis no Maranhão. A ação tem como iniciativa os movimentos sociais, as associações, os pesquisadores, os médicos e os militantes.

Para falar sobre esse assunto, o Jornal Tambor de terça-feira (26/03) entrevistou o educador e pesquisador da cannabis, Ricardo Monteles.

Essa questão foi discutida no Seminário “Políticas Públicas e Aspectos Regulatórios da Cannabis no Maranhão”, realizado no dia 21 de março, em São Luís.

O evento discutiu a regulamentação sobre o uso da Cannabis para fins terapêuticos, medicinais, veterinários, científicos e industriais no estado. Foi promovido pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE/MA) em parceria com a Acolhedeira (Associação Cultural de Pesquisa e Saúde com Cannabis).

Segundo o pesquisador, existem barreiras que impedem o acesso do uso da cannabis a mais pessoas. Dentre elas o preconceito, a classe política e as questões econômicas.

“As pessoas ainda têm muita dificuldade de encarar o tema. Apesar de toda essa construção ainda temos dificuldades no campo político. Os parlamentares não têm interesse sobre isso”, ressaltou o educador.

Ricardo falou que a cannabis medicinal está regulamentada no Brasil desde 2015. No entanto, como o cultivo da planta permanece proibido no país, os insumos têm de ser importados. Isto eleva o preço dos medicamentos.

Isso faz com que pessoas com pouca condições financeiras fiquem sem acesso aos remédios.

Para o educador, uma das saídas para baratear e democratizar o acesso à cannabis é a regulamentação. Além da atuação de associações de pacientes e o fornecimento dos medicamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

 

Henrique de La Rocque: apenas um encontro e a admiração

Em sua fantástica obra literária “Éramos Felizes e Não Sabíamos”, o magistral Bernardo Coelho de Almeida abre uma de suas crônicas sob o título “O melhor homem do mundo”, fazendo uma verdadeira dissertação sobre o saudoso Henrique de La Rocque, uma das lendas da política do Maranhão, que foi deputado federal, senador e membro do Tribunal de Contas da União, além de ter exercido o cargo de presidente do extinto IAPC (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários), entre fevereiro de 1951 e novembro de 1953, dando seus primeiros passos na vida pública.

Tive um encontro inesquecível com essa liderança política, em 1980, exatamente no ano em que renunciou ao mandato de senador para assumir a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas da União (TCU). Foi na redação do JORNAL DO TOCANTINS, em Imperatriz, numa sufocante manhã de quinta-feira. Na véspera, Mauro Bezerra liga para Imperatriz, me dizendo que iríamos receber a ilustre visita e que era para fazer cobertura de suas atividades naquela cidade e em João Lisboa. Ele estava se despedindo da vida parlamentar e tinha que agradecer aos leitores e às lideranças políticas.

Deleguei a Iran de Jesus dos Passos, atualmente professor da UEMA, a entrevista. Depois, o levei para conhecer as instalações do matutino. Fiquei impressionado com a simplicidade dele, por conta de sua elevada estatura política e moral.

Embora tenha apoiado a Ditadura iniciada com o Golpe Militar de 31 de março de 1964, sua posição após a instauração do regime ditatorial foi um tanto inconstante. Começando pelo fato que foi o primeiro a defender políticos perseguidos que estavam procurando asilo nas embaixadas. Segundo o Jornal do Brasil (em 16 de agosto de 1977), quando o processo de reabertura democrática era debatido, La Rocque manifestou apoio à abertura sob comando de Ernesto Geisel colocando que: “um homem forte como o presidente Geisel, desde que conte com o apoio dos políticos, poderá formular um projeto de reformas constitucional que concilie direitos individuais e segurança do Estado”.

Da mesma forma, defendia que os banidos por motivos políticos que retornassem ao país poderiam ter suas penas diminuídas contando o tempo que tivessem passado no exterior.

Em sua crônica, Bernardo discorre sobre sua forte amizade e o compadrio com La Rocque, citando, inclusive, que o ajudou na sua eleição ao Senado, quando concorreu com Neiva Moreira. O escritor diz que aproveitou o fato de ser diretor da Rádio Difusora, para utilizar o sistema em benefício da campanha do compadre, levando Neiva Moreira a reclamar junto a Magno Bacelar a respeito da manobra política.

Bernardo o enche de elogios, discorre sobre suas qualidades como homem público, relatando inclusive que a antológica música romântica “A noite do meu bem”, teria sido composta pela cantora Dolores Durans em homenagem ao político maranhense.

Confesso que estive nervoso nesse encontro. Mas ele me deixou à vontade na conversa, em meio aos momentos em que lhe mostrava as instalações e o maquinário do jornal. Me disse que além de advogado, era jornalista e que tinha atuado, na juventude, em cobertura diária junto o Supremo Tribunal Federal (STF). Quem o acompanhava era o então vereador Justino, de Imperatriz.

Em dado momento, ele me convida para a posse dele no TCU.

-Gostaria que você participasse da cobertura de minha posse no TCU. Lhe mando as passagens de ida e volta e reservo o hotel. Para você e o fotógrafo-, que era o saudoso Silvan Alves.

Não pudemos ir, por questão de logística. O jornal estava em sua fase inicial e não havia a possibilidade de eu e o único fotógrafo passarmos dois dias fora da cidade. Mas o Sistema Difusora mandou uma equipe de São Luís e estampamos em manchete a posse dele.

Foi uma conversa extremamente enriquecedora, em que ele me revelou alguns episódios da vida dele como político, falou sobre sua família, de origem portuguesa e me disse que eu poderia lhe visitar em seu gabinete a qualquer momento quando fosse a Brasília.

Fiquei lisonjeado com a postura de Henrique de La Rocque, cuja memória o Maranhão consegue preservar, sendo ele nome de município, praças, avenidas, escolas, públicas e privadas e de um dos palácios do Governo. Sua atitude para comigo, um simples jornalista em início de carreira, foi como inspiração e me transformou em seu admirador.

La Rocque começou sua trajetória na política como suplente de deputado federal pelo Distrito Federal em 1954 pelo (PSP), Partido Social Progressista. Em outubro de 1958, enfim elegeu-se no cargo, dessa vez concorrendo pelo Maranhão. Conseguiu a reeleição em 1962.

Reelegeu-se deputado federal em 1966, ficando no cargo até 1974, quando se elegeu senador da República pelo Maranhão de, ficando no cargo de 1975 a 1982

Com o encerramento do bipartidarismo no Brasil, juntou-se ao Partido Democrático Social (PDS) em maio de 1980. No mesmo ano, passou a exercer também o cargo de Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), nomeado pelo então presidente João Figueiredo. Ele nasceu em São Luís, em 8 de agosto de 1912 e faleceu no Rio de Janeiro, em 16 de agosto 1982.

O título de “melhor homem do mundo”, não foi conferido a La Rocque pelo seu amigo e compadre Bernardo Almeida, e sim pela poderosa Leal Leal, cujo nome verdadeiro era Leoncie Léa Correia Leal, mas que sempre foi tratada por Leinha. Uma das primeiras assistentes sociais do pais, ela era braço direito e protegida de dona Darcy Vargas, mulher do presidente Getúlio Vargas e presidente da LBA.

Conhecedora dos bastidores de Brasília desde sua inauguração, Leal Leal, destacou ser Henrique de La Rocque o melhor homem do mundo, numa conversa com outro expoente da política nordestina, o então senador piauiense Petrônio Portela, como revela Bernardo em sua crônica.

Foi apenas um encontro, em que ficou a boa impressão e grande admiração.

Fonte: https://www.djalmarodrigues.com.br/2023/12/03/henrique-de-la-rocque-apenas-um-encontro-e-a-admiracao/

São Luís confirma expectativas de desenvolvimento até 2025, segundo estudos iniciais da McKinsey Global

Em fevereiro de 2020, o blog “O Historiador” repercutiu um estudo da McKinsey Global, que indicava São Luís como uma das 19 cidades brasileiras, entre 600 no mundo, com maior potencial de desenvolvimento até 2025. Agora, após os desafios causados pela pandemia de Covid-19, o progresso da capital maranhense está sendo revisitado, evidenciando que as previsões de crescimento na área científica e tecnológica se concretizaram.

O estudo de 2011 já vislumbrava avanços em ciência e robótica, com destaque para a Universidade Virtual do Maranhão, hoje conhecida como IEMA, e as primeiras cirurgias para o tratamento da Doença de Parkinson realizadas no Hospital Carlos Macieira em 2010. Atualmente, o uso de canabidiol para o tratamento de doenças neurológicas, uma inovação amplamente apoiada por instituições como a UEMA, a Defensoria Pública do Estado, e o Instituto Tricomas, ganhou grande visibilidade. Em dezembro de 2023, a lei estadual 12.183/2023 regulamentou o uso de medicamentos à base de cannabis, solidificando o papel de São Luís na medicina avançada. Desde 2017, a Casa de Apoio Ninar, uma instituição pública do Estado, tem utilizado canabidiol com sucesso no tratamento de condições como microcefalia, autismo e epilepsia.

Além dos avanços médicos, um estudo recente do Instituto Brasileiro de Economia (IBE) colocou São Luís em 17º lugar entre as cidades brasileiras mais desenvolvidas, confirmando as previsões de crescimento econômico feitas há mais de uma década.

Com esses resultados, fica claro que São Luís se mantém firme no caminho do desenvolvimento, particularmente nas áreas de saúde e tecnologia, consolidando sua posição como uma das cidades mais promissoras do Brasil.

FERREIRA GULLAR: Presença de Clarice

Ia ser bom voltar a pensar nela, reler seus livros, pois é só neles que é possível reencontrá-la

 

MEU PRIMEIRO encontro com Clarice Lispector foi numa tarde de domingo na casa da escultora Zélia Salgado, em Ipanema, creio que em 1956. Eu havia lido, quando ainda vivia em São Luís, o seu romance “O Lustre”, que me deixara impressionado pela atmosfera estranha e envolvente, mas a impressão que me causou sua figura de mulher foi outra: achei-a linda e perturbadora. Nos dias que se seguiram, não conseguia esquecer seus olhos oblíquos, seu rosto de loba com pômulos salientes.

Voltei a encontrá-la, pouco tempo depois, no “Jornal do Brasil”, durante uma visita que fez à redação do “Suplemento Dominical”. Conversamos e rimos, mas não voltamos a nos ver num espaço de uns dez anos. De fato, só voltei a encontrá-la logo após voltar do exílio, em 1977. Ela ligou para minha casa: queria entrevistar-me para a revista “Fatos e Fotos”, para a qual colaborava naquela época.

Clarice já era então uma mulher de quase 60 anos, marcada por acidente que resultara em sérias queimaduras que lhe deixaram marcas na mão direita. Já quase nada tinha da jovialidade de antes, embora continuasse perturbadora em sua natural dramaticidade. Depois de ouvir dela algumas palavras carinhosas, decidi revelar-lhe como me fascinara em nosso primeiro encontro.

-Você era linda, tão linda que saí dali apaixonado.

-Quer dizer que eu “era” linda?

-E ainda é, apressei-me em afirmar..

Terminada a entrevista, despedimo-nos carinhosamente, mas no dia seguinte ela ligou de novo. Queria encontrar-me para conversar. Fui até sua casa, no Leme, e de lá fomos caminhamos até a Fiorentina, que ficava perto.

Lembro-me que Glauber Rocha, vendo-nos ali, veio sentar-se em nossa mesa e começou a elogiar o governo militar. Clarice me olhava para com espanto, sem entender. Ele, depois daquele discurso fora de propósito, mudou de mesa.

-Ele veio provocar você, disse Clarice. Com que intenção falou essas coisas?

-Glauber agora cismou de defender os milicos. É piração.

Depois dessa noite, voltei a vê-la num encontro que ela promoveu em sua casa com alguns amigos, entre os quais Fauzi Arap, José Rubem…

Foi a última vez que a vi. A roda-viva daqueles tempo me arrastou para longe dela, em meio a problemas de toda ordem, crises na família, filhos drogados, clínicas psiquiátricas. De repente, soube que ela havia sido internada num hospital em estado grave. Localizei o hospital, telefonei para o seu quarto e acertei com a pessoa que me atendeu ir visitá-la no dia seguinte. Mas, ao chegar à redação do jornal, antes de sair para a visita, a telefonista me passou um recado: “Clarice pede ao senhor que não vá vê-la no hospital. Deixe para visitá-la quando ela voltar para casa”. E se ela não voltasse mais para casa? Dobrei o papel com o recado e guardei-o no bolso, desapontado.

Àquela noite, quando contei o ocorrido a minha mulher, ela explicou: “Clarice, vaidosa como era, não queria que você a visse no estado em que estava”. Pode ser, mas, de qualquer forma, até hoje lamento não ter podido vê-la uma última vez.

Dois ou três dias depois do recado, ela morria. Ao sair do banho, pela manhã, alguém me informou: “Clarice Lispector morreu”. De viagem marcada para São Paulo, entrei num táxi que me levou pela lagoa Rodrigo de Freitas. Não poderia ir a seu sepultamento. O táxi corria dentro de uma manhã luminosa, enquanto a brisa balançava alegremente os ramos das árvores. Clarice morrera e a natureza o ignorava. No avião, escrevi um poema falando nisso. Que mais poderia fazer?

Alguns meses atrás, quando aceitei fazer a curadoria da exposição sobre ela, no Museu da Língua Portuguesa, todas essas lembranças me acudiram. Ia ser bom voltar a pensar nela, reler seus livros, pois é neles e só neles que é possível reencontrá-la agora e nunca naquele saárico túmulo do Cemitério Israelita do Caju, aonde certo dia, sob sol escaldante, fui, com Cláudia Ahimsa, visitá-la. Não havia Clarice nenhuma sob aquela laje de pedra, sem flores. E não havia porque, de fato, o que Clarice efetivamente foi, o que fazia dela uma pessoa única e exasperada, era sua patética entrega ao insondável da existência -e a necessidade de escrever, de tentar incansavelmente dizer o indizível, mas certa de que, ao torná-lo dizível, o dissiparia.

Não obstante, isso era tudo o que valia a pena fazer na vida, conforme afirmou: “Quando não escrevo, estou morta”.

Em compensação, quando a lemos, ressuscita.